PAGE: Diagnóstico da Paisagem Alimentar da Serra da Estrela

O Projeto PAGE – Paisagens Agrícolas e Alimentares com gerações de mulheres inovadoras tem como objetivo valorizar sistemas alimentares singulares, por meio do reconhecimento dos saberes tradicionais associados, da sistematização de inovações associadas a mulheres, da sistematização de processos capazes de atrair agentes inovadores (jovens) e da construção de redes e capital social nos territórios.

O projeto decorre em três territórios-piloto: Serra da Estrela, Barroso e Serra de Serpa, onde estão a ser realizados diagnósticos territoriais.

Neste artigo, aborda-se o caso concreto da Serra da Estrela e apresenta-se um resumo da caraterização do seu património alimentar.

Do estudo efetuado, destaca-se que foram identificados os esforços do Estado para promover alimentos tradicionais de qualidade, em particular, as Denominações de Origem Protegida e as Indicações Geográficas Protegidas.

No território da Serra da Estrela, isto é, dentro dos limites dos seis municípios pelos quais se distribui o Parque Natural da Serra da Estrela, foram identificados dez produtos tradicionais de qualidade.

Tendo por base estes dez produtos, procedeu-se à análise dos sistemas de produção que lhes subjazem. O primeiro aspeto relevante encontrado foi a existência de duas zonas no território envolvente da Serra da Estrela: o vale e a serra. Grosso modo, as culturas permanentes, em particular, o vinho do Dão e a maçã Bravo de Esmolfe, vêm do vale; a produção pecuária, isto é, o queijo, o requeijão e o borrego Serra da Estrela, vêm da serra. Trata-se, portanto, de dois sistemas agrários evidentemente distintos do ponto de vista edafoclimático, mas certamente também do ponto de vista socioeconómico.

Este relatório focou-se no sistema agrário presente na serra, particularmente, na região norte do Parque Natural da Serra da Estrela (PNSE) onde, segundo dados secundários e entrevistas com atores do território, a agricultura tradicional está melhor preservada.

São três as caraterísticas essenciais deste sistema:

1) a horta alimenta a família de pastores, enquanto o campo visa a produção de queijo para o mercado;

2) há uma divisão (ainda que a esbater-se) do trabalho por género: o homem cuida do rebanho e a mulher fabrica o queijo;

3) o sistema é lucrativo, mas impõe condições de vida que leva muitos pastores a abandonar a profissão.

A partir desta conceção foi realizada uma análise da contribuição dos operadores turísticos para a valorização do património alimentar da Serra da Estrela, que envolve os produtores de alimentos.

Notou-se que as estratégias dos operadores turísticos são dificultadas por dois fatores: pela imagem da Serra da Estrela (conhecida, antes de mais, pela neve) e que coloca o património alimentar em segundo plano; e pela forte concorrência de preços, o que impede o desenvolvimento de serviços de qualidade.

As relações entre os restaurantes e os produtores locais são excecionais e, quase sempre, implicam ligações pessoais fortes. Isto porque, por um lado, o queijo e o borrego são escoados facilmente a bom preço, enquanto o centeio, a couve, e outros produtos da horta não existem em volume suficiente para interessar aos operadores turísticos.

Consequentemente, em geral, os novos operadores turísticos que entram no setor ‘reproduzem’ o património alimentar local com produtos oriundos dos mercados globalizados.

Recorde-se que o PAGE é uma parceria liderada pela Escola Superior Agrária do Instituto Politécnico de Viseu (ESAV), e da qual fazem parte igualmente a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, I.P. (CCDRC), a Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP), o Centro de Competências de Agricultura Familiar e Agroecologia (CeCAFA), representado pela ACTUAR – Associação para a Cooperação e o Desenvolvimento, as PME VAGARI e ERVITAL e quatro jovens agricultores (Virtudes Outonais, Filipa Amaral, Vanessa Andrade e Sebastião Machado).

Nota: Artigo publicado na edição n.º 141 da Revista Jovens Agricultores, da AJAP. A sua reprodução, parcial ou na íntegra, requer autorização prévia da AJAP.