O PAGE na valorização das paisagens alimentares para a construção de redes e capital social

“Neste ‘mar de pedra’, expressão utilizada pelo poeta transmontano Miguel Torga, a biodiversidade é com sentidos. São cenários, paisagens e ambientes que encaixam na narrativa de qualquer estudo ou ‘estória’ da Península Ibérica. As pessoas mantêm o seu modo de vida pastoril. Os animais apascentam nos campos. Os agroecossistemas exibem uma preservação dinâmica. O legado do comunitarismo manifesta-se no respeito pela memória e, em alguns lugares e quase sempre, pela aplicabilidade em boas práticas”.

In Diagnóstico territorial da paisagem alimentar na região do Barroso (2024)

Texto: Joana Dias, Actuar – Associação para a Cooperação e o Desenvolvimento

Fotos: Marcelo Borges, Vagari

A partilha inter-geracional de conhecimentos tradicionais associados à preservação dinâmica e impressos na história e nas memórias de gerações de mulheres e homens guardiões das paisagens alimentares é um dos grandes fins do projeto PAGE – Paisagens Agrícolas e Alimentares com Gerações de Mulheres Inovadoras.

Cientes que a valorização de sistemas alimentares singulares decorre do reconhecimento dos saberes tradicionais a eles associados, a parceria do projeto PAGE está a desenvolver Diagnósticos Territoriais em três territórios-piloto no País (Serra da Estrela, Barroso e Serra de Serpa), contribuindo, assim, para a sistematização de inovações associadas a mulheres e para a sistematização de processos capazes de atrair jovens inovadores.

Os diagnósticos na Serra da Estrela e na Região do Barroso estão já em curso, a partir da identificação do património alimentar de cada um dos territórios, como porta de entrada para a caracterização dos sistemas agrícolas tradicionais subjacentes. Os diagnósticos estarão disponíveis no website do PAGE e deixam ante ver eixos relevantes para a promoção de sistemas alimentares.

No caso da Serra da Estrela, por exemplo, a viabilização do principal sistema agrícola é central, conferindo destaque, além do queijo e do borrego, também à castanha, batata, couve, enchidos, carne de porco e, muito particularmente, ao pão de centeio. Estes produtos são tão valorizados pelos restaurantes quanto o queijo ou o borrego, no entanto, a produção existente é ainda feita, sobretudo, para auto consumo das famílias. No caso do pão de centeio, por exemplo, tão valorizado e procurado, os padeiros e padeiras na Serra da Estrela não conseguem garantir mais do que um quinto da farinha local. Será, por isso, necessário estimular a produção destes alimentos para o mercado, como já se começou a fazer no caso da feijoca de Manteigas, com o incentivo do município.

É, efetivamente, a compreensão sistémica destas paisagens agrícolas e alimentares que permite encontrar e potenciar sinergias entre atores, produtos e serviços no contexto da dinamização da oferta turística nos territórios, através da valorização das suas paisagens alimentares e da construção de redes e capital social nos territórios.

Iniciado em 2023, o projeto PAGE é coordenado pela Escola Superior Agrária de Viseu e tem como parceiros a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, IP, a Associação dos Jovens Agricultores de Portugal, Centro de Competências de Agricultura Familiar e Agroecologia representado pela ACTUAR, duas PMEs (Vagari e ERVITAL) e quatro jovens agricultores (Virtudes Outonais, Filipa Amaral, Vanessa Andrade e Sebastião Machado).

Nota: artigo publicado na edição n.º 138 da Revista ‘Jovens Agricultores’, da AJAP. A sua reprodução, parcial ou na íntegra, requer autorização prévia da AJAP.