Excerto do artigo “Terra Velha”, na Revista Expresso 29/11

“Nos últimos dias, Firmino Cordeiro tem estado a trabalhar na apanha da azeitona. Não se pode dar ao luxo de confinar: “Há pouca mão de obra, somos só dois mais duas pessoas da família, tem sido difícil”, resumiu ao Expresso desde Trás-os-Montes, no final do quarto dia de trabalho. Foi jovem, já não é, e aos 51 anos continua a ser diretor da Associação dos Jovens Agricultores de Portugal (AJAP). O seu primeiro lamento vai para o impacto da pandemia nos produtores e empresas que perderam negócios cá dentro e viram as exportações caírem por terra. Mas Firmino Cordeiro também avisa que a covid-19 só veio dificultar no imediato algo que já era incerto a longo prazo: a subsistência da agricultura portuguesa.
Os últimos dados mostram que em Portugal o número de agricultores diminuiu cerca de 40% entre 1999 e 2016. Ainda estamos acima da média dos países da União Europeia, mas somos o país com menos futuro no sector: cerca de 52% dos agricultores portugueses têm mais de 65 anos, a percentagem mais alta em toda a UE; e só cerca de 4% têm menos de 40 anos — o segundo país mais velho, com menos de 11 mil profissionais. O Programa de Desenvolvimento Rural 2020 (PDR) apoia-se nestes números para definir como um dos seus objetivos a “renovação geracional” dos trabalhadores da terra, e na semana passada o Ministério da Agricultura anunciou €10 milhões para apoiar jovens agricultores que se queiram instalar em territórios de baixa densidade: €2 milhões para a instalação dos projetos, €8 milhões para as operações.
Firmino Cordeiro lembra que a agricultura portuguesa deu um salto em muitas áreas — horticultura, fruticultura, pequenos frutos, olival intensivo — o que se refletiu em qualidade, quantidade, e exportação. “Infelizmente muito do nosso território fica de fora desta evolução positiva e essa parte também é Portugal”, contrapõe. O diretor da AJAP diz que os apoios do PDR têm de ser “diferenciados” e ter em conta as regiões onde serão aplicados: na década de 80 isso acontecia, entretanto foi-se “desvanecendo”.
“É diferente instalar um jovem agricultor no Ribatejo, em Alqueva ou no Oeste, em comparação com a Serra Algarvia, Guarda ou Bragança”, enumera Firmino. É uma questão de conhecer as infraestruturas existentes e as dimensões das propriedades: “A legislação devia adaptar-se aos territórios de baixa densidade”, apoiando de forma menos cega mas consoante o tipo de projeto, a sua localização, inovação e sustentabilidade….O fosso “não se tem aligeirado no que respeita à economia, ao desenvolvimento, às opções de vida, à cultura, aos serviços sociais, escolares, de justiça e aos serviços de apoio aos empresários”, resume Firmino Cordeiro. O futuro da agricultura não tem só a ver com agricultura, mas com tudo o resto, porque “um jovem da cidade com vontade de vir pensa bem no que as regiões lhe podem oferecer.” Este agricultor conhece bem o JER, fez a tese de mestrado sobre ele, durante quase uma década contribuiu para que ele se tornasse uma realidade. “Agora só falta dar-lhe corpo e alma”, conclui.
TEXTO TIAGO SOARES 

INFOGRAFIA CARLOS ESTEVES

ILUSTRAÇÃO CRISTIANO SALGADO

https://expresso.pt/sociedade/2020-11-26-So-4-dos-agricultores-portugueses-tem-menos-de-40-anos.-Como-vai-ser-o-futuro-da-agricultura-nacional-