Gonçalo Rodrigues tomou posse como Secretário de Estado da Agricultura em fevereiro deste ano. Em entrevista à edição n.º 134 da Revista Jovens Agricultores, da AJAP, revela que aceitou o desafio porque quer “contribuir para a construção de respostas e soluções que façam a diferença na vida das pessoas”.
O governante analisa os primeiros meses de implementação do PEPAC em Portugal e faz um balanço (provisório) da Campanha do Pedido Único 2023, considerando que este “tem sido um processo muito exigente”. Porém, refere que a implementação do PEPAC 2023-2027 e do PU 2023 é um “projeto concretizável, sinónimo de um contributo precioso para uma agricultura que garanta o justo rendimento aos agricultores, preços justos aos consumidores, viabilidade socioeconómica às explorações e sustentabilidade no uso dos recursos naturais”. O Estatuto do Jovem Empresário Rural e a Dieta Mediterrânica são outros dos temas em destaque nesta entrevista com Gonçalo Rodrigues.
Que expectativas tem neste novo desafio à frente da Secretaria de Estado da Agricultura e que balanço faz até ao momento?
Felizmente tenho tido a oportunidade de contactar e de contribuir para a resposta a diversos desafios ao longo da vida. A principal expectativa que tive ao aceitar o honroso convite da Senhora Ministra Maria do Céu Antunes, foi o de continuar a fazer isso mesmo: contribuir para a construção de respostas e soluções que façam a diferença na vida das pessoas. Ou seja, conseguir colocar, ao serviço da política pública, a minha experiência e o meu conhecimento. Neste tempo que vivemos, provavelmente um dos mais desafiantes das nossas vidas, o balanço é francamente positivo, ainda que não possa ser conclusivo, uma vez que a tomada de posse foi há pouco mais de três meses.
O prazo de entrega de candidaturas no âmbito do Pedido Único 2023 (PU2023) foi prolongado para 14 de julho. Como está a decorrer, na sua opinião, estes primeiros meses de implementação do PEPAC em Portugal, e como vê a Campanha PU 2023, tendo em conta os vários constrangimentos relacionados com a morosidade do sistema e as inúmeras dificuldades com que se têm deparado muitos agricultores?
Bem sabemos que a mudança de ciclos de programação financeira é um processo que exige adaptação de todo o setor, incluindo das organizações dos agricultores, e da Administração Pública. Portugal garantiu, em tempo recorde, um acordo político para a reforma da Política Agrícola Comum (PAC), que esteve pelo menos três anos bloqueado, e conseguiu construir, de forma participada, o seu plano estratégico, que, como é obvio, reflete prioridades políticas e que está, neste momento, em fase de arranque de implementação. Certamente que, durante este processo de adaptação, fomos, e continuaremos a ser, confrontados com novos desafios. Mas o que importa verdadeiramente é que, um a um, com o inestimável contributo dos técnicos das confederações, dos agricultores e dos organismos da Administração Pública, os continuemos a ultrapassar e que, em momento algum, coloquem em causa o já habitual, ainda que sempre excecional, adiantamento de pagamentos aos agricultores durante o mês de outubro, conforme autorização anual por parte da Comissão Europeia. Tem sido um processo muito exigente, mas a implementação do PEPAC 2023-2027 e do PU 2023 são um projeto concretizável, sinónimo de um contributo precioso para uma agricultura que garanta o justo rendimento aos agricultores, preços justos aos consumidores, viabilidade socioeconómica às explorações e sustentabilidade no uso dos recursos naturais, indispensável para a produção de alimentos seguros, em quantidade e com qualidade.
Relativamente aos Jovens Agricultores, a AJAP congratula-se por se verificarem alterações positivas nos apoios ao investimento. No entanto, tendo em conta o enorme envelhecimento da população agrícola, considera que é preciso ir mais além nesta aposta? Como olha o Ministério da Agricultura para esta realidade?
Ambicionamos, todos, criar condições cada vez melhores para responder à questões demográficas que afetam o nosso País, nomeadamente, o abandono das terras. Aqui, a agricultura tem um contributo essencial para a fixação de pessoas no território e isso é um desígnio em todos os instrumentos de planeamento preparados nos últimos anos, agora a ser implementados. Seja na promoção do investimento, como se congratulam, seja no rejuvenescimento, o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum 2023-2027 e a Agenda para a Inovação da Agricultura 20 | 30 – Terra Futura refletem essa aposta. Não quero, como é obvio, maçar-vos com números, mas desde a abertura dos direitos, em especial nos territórios designados como vulneráveis, à majoração no âmbito dos investimentos realizados por jovens, há um conjunto de decisões que nos vão permitir contrariar o envelhecimento da população agrícola.
“Dotar o JER de instrumentos úteis para os jovens”
O Estatuto do Jovem Empresário Rural (JER), criado em 2019, pretende potenciar o empreendedorismo no mundo rural, a fixação de jovens nestes territórios e a criação de novas empresas. Este é um instrumento vital, ao dispor do País, para inverter a tendência de abandono e desertificação dos territórios rurais. Como vê este instrumento e como pode também o Ministério e outras tutelas, como a Coesão e Economia, dar-lhe o impulso que merece? Por exemplo, os GAL – Grupos de Ação Local, não poderiam ser um bom instrumento para impulsionar esta figura?
Há, como é evidente, dificuldades na implementação do Estatuto do Jovem Empresário Rural. Da bondade do mesmo ninguém duvida, mas a sua operacionalização pode ser melhorada. Temos consciência disso e vontade para o fazer, no sentido de, nomeadamente, dotar o JER de instrumentos úteis para os jovens. Estamos a trabalhar e não dispensamos os vossos preciosos contributos. Aliás, a cooperação e a partilha são ferramentas essenciais para alcançarmos os objetivos de criação deste estatuto.
O tema central desta edição é a Dieta Mediterrânica/Agricultura Sustentável, dois eixos também eles estratégicos da tutela. Este binómio, que naturalmente está co-relacionado, tem ainda muito caminho por desbravar em Portugal? Em que ponto estamos no que respeita a uma Agricultura mais verde e sustentável?
A sustentabilidade multidimensional é a chave do sucesso de qualquer que seja a política pública e, já agora, de qualquer investimento privado. É na garantia do equilíbrio entre a preservação dos recursos e o aumento da produtividade que se inserem os diversos instrumentos de planeamento e de financiamento da agricultura. E não falo só do PEPAC. Da Estratégia Nacional para a Agricultura Biológica, passando pelo Grupo de Acompanhamento para a Salvaguarda e Promoção da Dieta Mediterrânica e pelo Estatuto da Agricultura Familiar, sem esquecer o apoio às cadeias curtas e tantos outros instrumentos que poderia aqui referir, temos procurado, numa gestão integrada e coerente, reforçar a sustentabilidade do setor, convictos de que esta é essencial à valorização e diferenciação da produção e, consequentemente, à sua competitividade. A aposta do Ministério, acompanhada pelo empenho dos produtores, tem permitido o alcance de números que nos devem orgulhar. E, por falar em orgulho, a Dieta Mediterrânica é também sinónimo disso. Aliás, um dos objetivos da Agenda da Inovação para a Agricultura 20 | 30 – Terra Futura – passa por incrementar, em 20%, a adesão à Dieta Mediterrânica. E a prova de que temos dado passos em direção a essa meta está, designadamente, na implementação, com os territórios, do Plano Nacional para a Alimentação Equilibrada e Sustentável – mais um mecanismo de projeção e valorização do setor e da produção nacional, o qual, à semelhança da Agenda Terra Futura, traz, na sua raiz, a promoção de sinergias em prol de um desenvolvimento coeso e sustentável da Agricultura, de outras áreas de atividade associadas, dos territórios, do País. A Agricultura é, sem dúvida, parte da resposta aos desafios do presente e, com toda a certeza, uma oportunidade na construção de um futuro melhor para todas e para todos.
Nota: É com enorme satisfação que aceito o desafio da Associação de Jovens Agricultores de Portugal e me dirijo a todas e todos e, em especial, aos agricultores, através da vossa revista institucional. Sendo certo que, neste espaço, apenas cabe um pouco da ambição do País para a agricultura portuguesa e nele não se pretende descrever toda a política pública da Agricultura, valorizada e prestigiada nesta legislatura com a Alimentação. Obrigado pelo convite, contem sempre com a nossa disponibilidade para uma comunicação positiva, integradora e agregadora de vontades e ambições para concretizarmos objetivo de alcançarmos uma gestão ativa de todo o território baseada numa produção agrícola e florestal inovadora e sustentável.
Gonçalo Rodrigues
Esta entrevista foi publicada na edição n.º 134 da Revista Jovens Agricultores. A sua reprodução, parcial ou na íntegra, requer autorização prévia da AJAP.